COP28: Clima ambíguo | ESG – Finanças Global On

COP28: Clima ambíguo | ESG

Hoje começam as negociações climáticas que novamente ocorrerão em um contexto de crises mundiais. As emissões de gases de efeito estufa (GEE) bateram novos recordes de alta. De um lado, a temperatura global já subiu 1.2C° na média. De outro, a ambição atual das metas climáticas nos coloca na trajetória de aquecimento global da ordem de 2.4°C a 2.6°C. Essa trajetória está apresentada na síntese do Balanço Global do Acordo de Paris que traz um retrato dos atuais esforços climáticos, os quais ainda são insuficientes para dar conta do objetivo de não ultrapassar o 1.5°C ou 2°C de aquecimento global.

A COP28 se propõe a ser um espaço para os países responderem ao Balanço Global com um plano para promover transformações sistêmicas nos principais setores econômicos para mitigar emissões, fortalecer resiliência aos impactos climáticos e progredir no financiamento climático para os países mais vulneráveis.

Alguns contextos são contraditórios nessas agendas. Dados mais recentes destacam que os países planejam produzir mais do dobro da quantidade de combustíveis fósseis em 2030 do que seria consistente com a limitação do aquecimento global a 1,5°C.

Contrastando com esta realidade, o novo relatório da Agência Internacional de Energia apresenta os esforços que seriam necessários para a indústria de petróleo e gás realizar a transição para emissões líquidas zero com o vistas a limitar o aquecimento global em 1.5 °C, os quais são: mitigar as emissões em suas próprias operações em 60% até 2030; e destinar 50% das despesas de capital a projetos de energia limpa até 2030.

Voltando para a realidade atual, é simbólico que a COP28 será sediada em um país que é o 7º maior produtor de petróleo do mundo, os Emirados Árabes Unidos. Retornaremos a esses pontos no final do artigo.

O Brasil levará para a COP28 as metas de mitigação de emissões de 48% até 2025 e de 53% até 2030. Há expectativa de um papel construtivo do governo brasileiro na COP28 que tem boas notícias com a queda de 22% do desmatamento na Amazônia, lembrando que devemos considerar também os desafios para o combate ao desmatamento em outros biomas, incluindo o aumento do desmatamento no Cerrado. O Brasil tem feito esforços para criar um mecanismo global de conservação de florestas com aproximadamente 80 países, que será apresentado na COP28.

Além disso, irá lançar planos, com apoio do BNDES, para atuar intensivamente na região do arco do desmatamento que avança velozmente na Amazônia. Outras iniciativas nacionais estão na agenda, como o programa de transição ecológica e o projeto de lei do mercado de carbono que está em fase final de tramitação no Congresso. Além do desafio de criar os mecanismos para a implementação das promessas e planos, uma grande questão para agenda brasileira está na área da indústria de óleo e gás, pois o País planeja se tornar o quarto maior produtor de petróleo do mundo até 2030.

O relatório completo do primeiro Balanço Global será lançado na COP28. Esse é um dos pontos mais relevantes desta COP pois ele trará à tona a avaliação do progresso coletivo para alcançar os objetivos do Acordo de Paris e informará os países sobre potenciais áreas para atualizar e melhorar seus esforços. É esperado que os países revisem seus planejamentos e apresentem um plano de resposta à luz do Balanço Global.

Para tanto, será necessário aumentar a ambição e implementar compromissos já oferecidos pelos países para atingir pico de emissões até 2025, reduzir 43% em 2030 e em 60% em 2035 com base no ano de 2019. Também indica a necessidade de neutralidade climática em 2050.

No tema mitigação, a COP27 finalizou o “Programa de Trabalho de Mitigação” mantendo o objetivo de aumentar a ambição e a implementação dos compromissos assumidos, prevendo sua execução até 2026, mas ficou aquém do esperada face ao que é necessário para atingir os objetivos do Acordo de Paris. Nesse ponto, espera-se que na COP28 esse Programa seja elaborado à luz do Balanço Global, visando acelerar ações de mitigação e financiamento climático, bem como um pacote de metas para Energia

Nas COPs passadas, não houve avanços concretos para o financiamento climático no sentido de viabilizar o aporte dos valores prometidos pelos países desenvolvidos há mais de uma década para mitigação e adaptação: 100 bilhões de dólares ao ano, entre 2020 e 2025. Durante esse ano ocorreram diálogos sobre o estabelecimento de uma nova meta de financiamento pós-2025 e preparação de relatório para alinhamento de fluxos financeiros com os objetivos de Paris. Espera-se pela apresentação do relatório sobre essas tratativas na COP28.

O estabelecimento de novos arranjos de financiamento para apoiar os países em desenvolvimento em perdas e danos foi o grande destaque da COP27. Foi instituído um Comitê que apresentará recomendações para serem adotadas na COP28 visando avanços para operacionalização desses arranjos. Será necessário discutir onde o fundo de perdas e danos será sediado, sua composição, que países irão contribuir e quais serão os beneficiários do fundo.

Na COP27, foi elaborado o framework para definir Objetivo Global de Adaptação. Na COP28, espera-se que os países tratem dos objetivos de médio e longo prazos, métricas e indicadores para adaptação. É necessário avançar nos meios de implementação e definir como esses objetivos contribuem para o processo de Balanço Global. Nessa COP, os países buscarão colocar em vigência o Objetivo Global de Adaptação visando o melhor monitoramento do progresso das ações para adaptação.

No tema mercado de carbono global, mais esforços serão necessários para avançar na arquitetura técnica e administrativa necessária para a operacionalização dos mecanismos previstos no art. 6 do Acordo de Paris. Transações entre países (art. 6.2) já são possíveis e vem ocorrendo timidamente. Com um maior número de países usufruindo dessa abordagem cooperativa, é importante que as negociações na COP28 avancem para fortalecer as diretrizes de relato e rastreamento dessas transferências, contribuindo para a transparência do mecanismo e evitando dupla contabilização.

Em relação à implementação de um mercado de créditos de carbono global acessível para países, empresas e indivíduos (art. 6.4), muitas escolhas não foram feitas na COP anterior, empurrando definições importantes para o encontro deste ano. Quais tipos de projetos e metodologias de contabilização serão aceitas? Como garantir a integridade ambiental dos resultados de mitigação obtidos? E como contemplar remoções de carbono?

Nas vésperas da COP28, o órgão supervisor da Convenção do Clima responsável pela implementação do art. 6.4 chegou a um consenso sobre o conjunto de diretrizes metodológicas necessárias para operacionalizar o novo mercado de créditos de carbono. Se tais diretrizes forem aprovadas durante a COP28, há expectativas de que o mecanismo possa iniciar seu funcionamento em 2024.

Em uma entrevista recente, o economista Robert Stavins resumiu bem o problema geopolítico enfrentado: “As posições dos negociadores baseiam-se em avaliações dos custos e benefícios de cada país e não nos danos mundiais”. Nesse sentido, na visão de curto prazo, ainda parece improvável que países abram mão de novas explorações de petróleo, incluindo o Brasil. De fato, a questão sobre o uso do petróleo para financiar uma transição mais rápida para a neutralidade climática tem ganhado destaque no debate global. Nesse sentido, o resultado dessa COP, sediada em região central para a produção global do petróleo, será um termômetro do nível de realidade da ambição e implementação de ações face às transformações necessárias.

Ainda não chegamos no pico de emissões globais para iniciarmos seu rápido declínio. Quanto mais adiarmos este momento, maiores serão os custos da adaptação, já que a demora intensificará o aquecimento global e consequentemente a frequência e intensidade dos impactos distribuídos pelo mundo. A lentidão também fechará janelas de oportunidades para mitigação, pois serão necessários cortes profundos de emissões em menor espaço de tempo, sem que a transição possa ocorrer de forma mais gradativa. O nível de resposta dos países ao Balanço Global, portanto, assume relevância central para que transformações sistêmicas sejam implementadas a tempo de se evitar impactos disruptivos na nossa sociedade.

Guarany Osório é professor e Coordenador do Programa Política e Economia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da FGV EAESP. Doutor em Administração Pública e Governo pela FGV EAESP. Mestre em Direito, na área de Ciências Jurídico-Ambientais, pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

Guilherme Lefèvre é professor e Gestor do Programa Brasileiro GHG Protocol do FGVces. Mestre em Ciência Ambiental pela Universidade de São Paulo (USP) e Graduação em Direito pela Universidade de Leiden na Holanda.

Guarany Osório, da FGV — Foto: Divulgação
Guarany Osório, da FGV — Foto: Divulgação

Guilherme Lefèvre — Foto: Divulgação
Guilherme Lefèvre — Foto: Divulgação

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