Câmara de SP sinaliza apoio à cassação de vereador acusado de racismo | Política – Finanças Global On

Câmara de SP sinaliza apoio à cassação de vereador acusado de racismo | Política

A Câmara Municipal de São Paulo tem sinalizado apoio à cassação do vereador Camilo Cristófaro (Avante) por quebra de decoro parlamentar, depois de uma fala racista. A tendência, segundo lideranças dos partidos, é de que a maioria dos vereadores vote pela perda do mandato do parlamentar na corregedoria, em sessão que será realizada nesta quinta-feira (24), e no plenário, na terça-feira (29).

Camilo Cristófaro foi flagrado em maio do ano passado, em uma sessão da CPI dos aplicativos, na Câmara Municipal, dizendo a frase racista: “Eles lavaram e não lavaram a calçada. É coisa de preto, né?”. A sessão era híbrida e o vereador, à distância, não percebeu que o microfone estava aberto. Os vereadores abriram um processo contra Cristófaro na corregedoria, mas o caso ficou parado por cerca de um ano.

Nesta semana, na segunda-feira (21), o relator do caso, Marlon Luz (MDB), protocolou um pedido de cassação de Cristófaro por quebra de decoro parlamentar. A maioria dos integrantes da corregedoria deve acompanhar nesta quinta-feira o relator na defesa da perda do mandato.

A corregedoria é composta por sete integrantes, mas o corregedor-geral, Rubinho Nunes (União), só votará em caso de empate. Dos seis vereadores que devem votar, cinco indicaram apoio à cassação – apenas Sansão Pereira (Republicanos) tem dito que não apoia. Procurado pela reportagem, Pereira não concedeu entrevista.

Se a cassação for aprovada pela corregedoria, o caso será votado em plenário na terça-feira e a tendência é que a maioria dos vereadores também vote pela perda de mandato. Lideranças partidárias estimam que dos 55 vereadores, pelo menos 40 devem apoiar a cassação. É mais do que os 37 votos necessários (dois terços do total de vereadores) para a perda de mandato. Caso a cassação se confirme, será a primeira da história da Câmara Municipal de São Paulo por racismo.

Os movimentos populares, principalmente os movimentos negros, devem fazer atos na Câmara na quinta-feira e na próxima terça-feira, para pressionar pela cassação. Entre eles estão o Uneafro, o Unegro, Giro Preto e Raiz de Liberdade.

Punição é necessária, diz relator

Em seu relatório, com 20 páginas, Marlon Luz disse que Cristófaro acredita que existem “seres humanos superiores a outros” e que “as pessoas negras são necessariamente encarregadas de executar trabalhos manuais e que sua suposta ineficiência está relacionada à sua etnia”.

O relator afirmou que “manifestações preconceituosas” representam quebra de decoro parlamentar e que, embora a perda de mandato seja uma medida extrema, ela se mostra “completamente necessária” para preservar a integridade da Câmara e “garantir a responsabilidade ética” dos vereadores.

Ao Valor, Luz disse que Câmara precisa “dar exemplo” à população e que “quem não apoiar a cassação é a favor do racismo”.

O vereador registrou no relatório que não é a primeira vez que Cristófaro tem um comportamento inadequado e citou outros dois casos de injúria racial contra vereadores. Ele já chamou Fernando Holiday (PL) de “macaco de auditório” e gravou um vídeo para criticar George Hato (MDB), de ascendência asiática, realizando “um gesto pejorativo, puxando os olhos com as mãos”.

Há também denúncias de agressão a um funcionário de 62 anos da Câmara, e ameaças a George Hato e a então vereadora Isa Penna, quando teria chamado de “vagabunda” e “terrorista”.

A vereadora Luana Alves (Psol), que entrou com a representação contra Cristófaro na corregedoria, lembrou que “racismo é crime” e afirmou que uma declaração como essa é uma “vergonha institucional” para a Câmara.

O caso de Cristófaro está tramitando há um ano e três meses na Câmara Municipal, num ritmo bem diferente do que aconteceu, por exemplo, com o então deputado Arthur do Val na Assembleia Legislativa de São Paulo no ano passado. Arthur do Val foi cassado dois meses depois da divulgação de áudios sexistas, nos quais falava que mulheres ucranianas são “fáceis porque são pobres” e comparou uma fila de refugiadas a uma fila de balada.

“Mamãe Falei”, como também é conhecido, estava isolado politicamente na Assembleia, depois de brigar com deputados do Conselho de Ética, perder apoio dentro de seu partido e queimar pontes com os parlamentares. E a cassação se deu em um ano eleitoral, quando parcela significativa dos deputados tentou a reeleição.

A declaração racista de Camilo Cristófaro foi feita em maio, mesmo mês em que Mamãe Falei foi cassado na Alesp. A polêmica do vereador também gerou uma forte comoção e pressão popular. Cristófaro foi desfiliado do partido em que estava, o PSB, mas o vereador conseguiu ganhar tempo no Judiciário e buscou apoio dentro da Câmara.

Ex-deputado estadual paulista Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei — Foto: Carol Jacob/Alesp

Cristófaro contestou no Judiciário a escolha da primeira relatora, a vereadora Elaine Mineiro (Psol), do mandato coletivo Quilombo Periférico. Ela é negra e o vereador alegou que ela poderia ser parcial nesse caso. Em um indicativo de corporativismo, três vereadores que integravam a corregedoria se recusaram a relatar o caso, alegando que estavam muito ocupados. Outros deixaram a corregedoria porque não queriam cassar Cristófaro.

Politicamente, Cristófaro é da base do governo, tem indicados políticos na gestão municipal e pressionou os vereadores a não cassá-lo. Aliados do vereador negociam uma pena mais branda, como advertência ou suspensão.

Quando o caso completou um ano, houve pressão popular por um desfecho e o corregedor, Rubinho Nunes, deu celeridade ao processo. Indicou um novo relator para o caso, o vereador Marlon Luz, que em três meses entregou o pedido de cassação.

O vereador Danilo do Posto (Podemos), que entrou na corregedoria há cerca de um mês, disse que os vereadores que deixaram o colegiado defendiam uma outra punição a Cristófaro. Danilo disse que votará a favor da perda de mandato e afirmou que é preciso dar uma resposta à sociedade contra o racismo.

O corregedor geral, Rubinho Nunes, afirmou que ao assumir o cargo, procurou dar “celeridade” e “respostas” aos processos e disse que a demora na tramitação se deu, em parte, pela falta de indicações das bancadas dos vereadores para a corregedoria. “Tanto é que depois que foram feitas as indicações e escolhido o relator, ele entregou o relatório em três meses”, disse. Nunes disse que não é possível comparar com o caso de Mamãe Falei na Alesp, por “serem casos diferentes, em Casas diferentes” e desconversou sobre a eventual cassação de Cristófaro. “Como corregedor, tenho evitado me posicionar para garantir a imparcialidade”, disse.

O caso de Camilo Cristófaro tramita também no Judiciário. Em julho, o vereador foi absolvido, em primeira instância, pelo juiz Fábio Aguiar Munhoz, da 17ª Vara Criminal de São Paulo, que avaliou que a fala do parlamentar foi “extraída de um contexto de brincadeira, de pilhéria” e que não tinha um “contexto de segregação, de discriminação”.

O juiz disse ainda que era preciso provar a “vontade de discriminar” e que não bastaria “recortar as falas do contexto”. O Ministério Público recorreu da decisão.

Cristófaro pediu desculpas pela declaração, disse que é vítima de “perseguição política” e que a frase foi tirada de contexto. Quando foi absolvido em primeira instância, afirmou que a decisão do Judiciário de absolvê-lo representa uma vitória “da justiça e da verdade”. Cristófaro, por meio de sua assessoria, foi procurado pelo Valor para comentar o relatório que será votado na corregedoria, mas não se pronunciou.

Os casos mais recentes de cassação na Câmara Municipal são de 1999, de Vicente Viscome e de Maeli Vergniano. Viscome foi acusado de comandar um esquema de propinas, da Máfia dos Fiscais, e Maeli, de uso indevido de um carro cedido por uma empresa responsável pela coleta de lixo.

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